A terceirização e a conta da crise

28/03/2017 (Atualizado em 28/03/2017 | 15:41)

Valadares
Valadares

 

 

"A força do direito deve superar o direito da força”. Rui Barbosa

 

A expansão do emprego não se dará fragilizando as relações de trabalho. Resultará, antes, da retomada do crescimento pela qual estamos empenhados. A redução do desemprego será reflexo natural da restauração das condições econômicas e do ambiente seguro e de estímulo à produção.

Falo isso porque, na semana passada, fomos surpreendidos pela aprovação na Câmara dos Deputados de um controverso projeto – “engavetado” desde 1998 – que tornou irrestrita a chamada terceirização do trabalho.

Considerado pelo empresariado e pelo governo parte do esforço para superação da crise – por supostamente estimular a geração de emprego -, o texto, no entanto, peca pela insuficiência de salvaguardas ao trabalhador.

Os empresários brasileiros têm dado exemplo salutar de criatividade para suportar os efeitos da grave recessão, pressionados que são pelos custos e pela enorme carga tributária. A eles faço justiça. Mas é preciso considerar que o projeto aprovado pode enfraquecer o lado mais fraco da relação trabalhista.

Todos sabem que a parte mais fraca sempre é o trabalhador. Inegavelmente, em qualquer relação empresa-empregado, quem detém o poder maior é o patronato.

E o que diz a terceirização aprovada na Câmara? Em resumo, as empresas podem contratar trabalhadores terceirizados de outra empresa, em qualquer ramo, para a execução de qualquer tarefa, seja em atividade-fim (principal) ou atividade-meio (limpeza, segurança ou manutenção).

Atualmente, a terceirização é permitida somente nas atividades-meio, consideradas de suporte, nos termos da Súmula nº 331, do Tribunal Superior do Trabalho.

Ou seja, pelo que diz o TST, uma montadora pode contratar faxineiros ou segurança de uma empresa terceirizada. A partir da legislação ora proposta, o próprio operário poderá ser terceirizado.

Os trabalhadores dessas empresas terceirizadas são também submetidos às regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), mas atuam em condições nem sempre isonômicas.

Entre outros pontos, o texto aprovado não garante o mesmo salário nem os mesmos benefícios para os terceirizados e os contratados diretamente, ainda que exerçam as mesmas funções, na mesma firma.

Dito isso, vale observar que a chamada precarização do trabalho – como salários menores e jornadas maiores – já faz parte da realidade de parcela dos 13 milhões de terceirizados do país.

Levantamento do Departamento Intersindical de Estudos Socioeconômicos (Dieese) aponta que terceirizados trabalham, em média, três horas a mais que os empregados diretos. Além disso, ficam, em média, 2,7 anos no emprego intermediado, enquanto os contratados permanentes se mantêm em seus postos de trabalho por 5,8 anos.

O Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) mostrou que os salários de empregados terceirizados são, em média, 17% menores. Talvez por conta do menor apego à observância de normas de segurança por parte da empresa contratante, os terceirizados convivem com risco maior de acidente de trabalho. De acordo com pesquisa da Central Única dos Trabalhadores (CUT), em parceria com o Dieese, 80% dos acidentados, em média, são terceirizados.

Sim, é fundamental reverter o clima de desalento, em especial entre os mais pobres, os mais vulneráveis. E, de fato, o desemprego é a face mais cruel da recessão.

Mas, em que pese a necessidade de gerar emprego e atualizar a legislação trabalhista – considerando que os modelos de empresas no mundo moderno são dinâmicos e diferenciados -, qualquer iniciativa no sentido de alterar regras precisa necessariamente levar em conta o direito do empregado.

O empresariado alega que a lei trabalhista engessa e encarece a contratação e que as novas regras tirariam terceirizados da informalidade. Porém, insisto que é imprescindível assegurar normas justas para o trabalhador, que não pode pagar a conta da crise. É fundamental considerar o padrão a ser utilizado nas contratações.

 

*Autor: Senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE)

 

 

Apesar do pouco tempo que temos, uma vez que o presidente Temer dispõe de 15 dias para sancionar o projeto aprovado pela Câmara, nós, no Senado, também vamos discutir a necessidade de regulação e de ampliação do trabalho terceirizado, a partir de outro projeto em tramitação na Casa que também trata do tema. Nosso foco estará na garantia constitucional de isonomia e de proteção ao assalariado brasileiro.

Fonte: Antônio Carlos Valadares*