Secretário estadual da
LGBT Socialista, Thiago Abreu lamenta que 2019 tenha sido marcado por
retrocessos do poder público no que diz respeito aos direitos dessa população. Ao
mesmo tempo, comemora as conquistas do segmento e traça algumas metas para
2020. Confira:
PSB- Qual o principal
desafio do movimento em 2019? E para 2020?
Thiago - Em 2019, foi
enfrentar todos os retrocessos do governo Bolsonaro, e não só o dele, mas de
todo esse processo político e cultural que estamos vivendo. Por exemplo: a
extinção do Conselho Nacional de Discriminação LGBT, ocorrido justamente no dia
do Orgulho LGBT, o 28 de Junho. É um ataque concreto. Logo que o Bolsonaro
assume a presidência, ele já fala em realizar um desmonte de todas as políticas
que já haviam sido conquistadas pela população LGBT, e é uma situação muito
preocupante. Tirando essa parte de ataques, a gente tem o resto da conjuntura
da politica na qual está muito explicita na Câmara Federal, como na bancada do
PSL, que tem todo esse histórico contra a LGBT. Incitou-se uma caça às pessoas
LGBT, uma propagação em larga escala do ódio. Isso nos preocupa, também, para
2020. Foi um ano difícil, com morte com requintes de crueldade. Crimes de ódio ainda estão presentes e é uma
questão estrutural na nossa cultura. Em 2019, a violência foi incitada
constantemente. Tudo aquilo que ficou guardado nos armários dos conservadores veio
para fora com o governo Bolsonaro.
PSB – Que conquistas você
citaria no último ano?
Thiago – Conseguimos a criminalização, via STF, da LGBTfobia. É um marco histórico, nossa população foi ao menos atendida minimamente, mas ainda é muito preocupante que a gente não tenha em nosso país uma legislação específica para a população LGBT. O STF tomou essa iniciativa de criminalizar, mas os demonstrativos, os dados todos, são alarmantes. Em 2017, foram 445 assassinatos da população LGBT no país e, em 2018, foram 345. Falo em população, pois deixamos de ser comunidade há muito tempo. Somos 2 milhões de LGBTs no país, o que corresponder a um Estado. Não é uma comunidade isolada. São milhões de pessoas que estão aí e merecem respeito e dignidade de todos os cidadãos, mesmo a gente tendo mais de 30 direitos a menos que pessoas heterossexuais.
PSB – E como está a
estrutura do segmento atualmente?
Thiago – Em pelo menos 15 municípios
temos LGBT atuando. A ideia é expandir em 2020. Uma das principais pautas que
tenho assegurado é ter 10 candidaturas prioritárias no PSB no nosso segmento.
Hoje temos um prefeito e dois vereadores LGBTs, mas a ideia é eleger mais pessoas,
dar estrutura para que possam trabalhar e ampliar nossa bancada em várias
cidades. Mais gente tem nos procurado para se filiar e disputar eleição. Ainda
é complicada a estruturação do segmento. Ainda falta fomento dos presidentes
municipais do PSB. Isso é uma preocupação. Enquanto não houver entendimento dos
nossos legisladores municipais da importância do segmento LGBT para a estrutura
partidária, a gente ainda vai avançar a passos muito curtos. Seria fundamental
que em todas as cidades onde temos o PSB estruturado tivéssemos também o
movimento LGBT forte. Isso, infelizmente, não é uma realidade. Mas a gente tem
de seguir na luta.
PSB – Vivemos um momento
de muitos retrocessos. Como o movimento pode contribuir para que o campo
progressista não perca espaço?
Thiago – Colocando nosso
nome à disposição. Não basta uma cota LGBT. Tem de disputar um espaço, mas com
conhecimento, formação e capacidade técnica. A gente ter legislador LGBT não
significa que ele pauta a questão LGBT, por isso é tão importante a formação.
Sem isso, não tem como ampliar ou ocupar espaços. A ideia é que em 2020 a gente
consiga disputar prefeituras, câmaras de vereadores. É a partir da política que
a gente vai conseguir que a transformação se faça efetiva, levar a política
pública que até aquele travesti que ainda vive da prostituição porque é a única
alternativa que lhe resta. Não é natural que a gente deite à noite e durma
tranquilo sabendo que essas pessoas ainda vivam na vulnerabilidade.
PSB – Como atrair mais
LGBTs para a política?
Thiago – O processo não é fácil. A população LGBT vive com muito medo,
pois durante muito tempo foi usada como massa de manobra política. É procurada
pelos partidos políticos, mas quando chega o momento de efetivar a política
pública, pensar numa conjuntura e estruturar projetos, os partidos políticos
dão para trás, retrocedem. É muito complicado. Precisamos ser muito didáticos
para fazer com que todos compreendam que é através da política que a gente vai
conseguir estabelecer a cidadania da população LGBT. Tenho dito que existem
outros partidos políticos com setoriais LGBT. É ótimo. Mas o PSB se diferencia:
no partido, os LGBTs participam da tomada de decisão, nosso segmento é
estatutário. A partir do momento que um secretário ou secretária ocupa um
espaço, seja numa executiva municipal ou estadual ou nacional, esse LGBT também
está sendo protagonista daquele momento político. O PSB nos permite isso.
Geralmente, na conjuntura dos outros partidos, são pessoas brancas e
heterossexuais que estão no processo de construção e tomada de decisão. Nos PSB
as coisas não funcionam assim. Nosso partido forma quadros políticos com
capacidade intelectual e técnica para apontar políticas LGBT. E a gente não
pode ser hipócrita e dizer que o PSB tem centenas de LGBT no Estado. Mas acho
que a gente consegue ser mais efetivo com menos pessoas, desde que essas
pessoas tenham as condições técnicas necessárias. Por isso temos conseguido
atrair pessoas para o movimento LGBT do partido.
PSB – Ainda há
preconceito às pessoas LGBT na política? Se há, como combater isso?
Thiago – Existe, e muito. O embate é necessário e, dependendo da situação, é sinônimo de respeito. Mas não é solução para tudo. Às vezes as pessoas não têm informação, e isso faz muita falta. Quando a gente faz uma militância de didática, a gente consegue ter exito e não transformar as pessoas, mas abrir um pouco a mentalidade delas e a capacidade de desenvolverem uma espécie de empatia, fazer com que se coloquem no lugar do outro. Não se muda de opinião do dia para a noite, mas ao se colocar no lugar do outro, é possível estabelecer algumas relações. Falando institucionalmente, existem pessoas com idade mais avançada dentro do partido que talvez não compreendam a pauta LGBT, mas quando conseguimos ser didáticos e fazer essa pessoa compreender que na família dela, com certeza, existe uma pessoa LGBT e pode ser um filho, um tio, um sobrinho ou até o próprio marido, conseguimos avançar e reduzir o preconceito. Infelizmente, dentro de qualquer estrutura há aquela retaliação ou cometário desagradável, mas é através do trabalho que conseguimos superar esse obstáculo, essa falta de informação. Acho que o momento exige que tenhamos o bom senso de construir a unidade. Qualquer pessoa que pense em políticas progressistas, de dignidade humana e cidadania, não pode deixar de lado a questão LGBT. Querendo ou não, nosso segmento consegue ser transversal a todos os outros do PSB. A gente não pode ignorar isso. Realizar a crítica pela crítica não fará nosso segmento e partido crescerem. A nossa missão, enquanto liderança estadual LGBT, não é só propor protagonismo de nossa pauta, é também dar condições para que o partido avance de forma estrutural. A Autorreforma que o partido está realizando é uma oportunidade que nosso segmento tem de se estruturar, colocar suas demandas e pautas, fazer com que o partido compreenda que a cidadania LGBT é importante.
Fonte: Comunicação/PSB RS