Pela primeira vez, disputa na OAB-SP tem duas mulheres

13/10/2021 (Atualizado em 13/10/2021 | 11:14)

Foto: Divulgação
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Fundada em 22 de janeiro de 1932, a seccional paulista da OAB  (Ordem dos Advogados do Brasil), a maior do País, nunca teve uma mulher na presidência da entidade, mas, pela primeira vez, tem duas advogadas disputando a eleição. As criminalistas Dora Cavalcanti, de 50 anos, e Patrícia Vanzolini, de 49, concorrem em chapas de oposição à atual gestão do advogado cível Caio Augusto Silva dos Santos, 46 anos, candidato à reeleição.

A abertura da inscrição das chapas será nesta quarta-feira (13). Estão aptos a votar 278.852 advogados e advogadas em um universo de 406.000 inscritos. Desse total, 50,3% são mulheres, segundo dados da OAB.

Segundo reportagem do Estadão, uma resolução do Conselho Federal da entidade estabeleceu paridade de gênero e política de cotas raciais a partir das eleições deste ano, marcadas para novembro. Só estarão aptas a participar, portanto, as chapas com, no mínimo, 50% de mulheres e 30% de negros. “Vejo com naturalidade a disputa com duas mulheres. Faz parte do momento que estamos vivenciando. Nossa gestão não foi masculina e já é inclusiva”, disse o atual presidente da OAB-SP.

Natural de Bauru, onde mantém seu escritório, Caio Augusto liderou, em 2018, um movimento entre os advogados “de base” que usavam a cor amarela como símbolo. Ele nega, porém, que tenha votado em Jair Bolsonaro para presidente.

Já suas adversárias são paulistanas. Dora Cavalcanti tem escritório na rua Oscar Freire e formou-se na USP, onde atuou no movimento estudantil. Patrícia Vanzolini, que nasceu durante o exílio dos pais, em Santiago, no Chile, e veio com 1 ano para São Paulo, tem escritório na Avenida Paulista, é professora do Mackenzie e formou-se na PUC-SP.

Até a quinta-feira passada, Patrícia era apontada como candidata a vice na chapa que seria “em tese” encabeçada pelo advogado Leonardo Sica, mas a cabeça de chapa foi anunciada em uma live que pegou muita gente de surpresa. “Sempre consideramos essa possibilidade, mas havia uma tendência machista de acharem que o candidato era ele”, disse a advogada.

Patrícia Vanzolini – Foto Divulgação

Diante do novo modelo de representatividade na categoria, era de se esperar que o debate sobre o machismo estrutural na advocacia ganhasse corpo. “Está na hora de conter o machismo e o racismo estrutural. Basta olhar a galeria de retratos da OAB. Na última eleição, nenhuma mulher foi eleita presidente em nenhuma seccional”, disse Dora. Sua candidata a vice é a advogada Lazara Carvalho, negra e especialista em atendimento a mulheres vítimas de violência doméstica.

Entre os adversários, Dora é quem atua nos casos de maior repercussão nacional, e enfrentou o juiz Sérgio Moro na Lava Jato quando esteve na defesa da Odebrecht. A advogada, que foi sócia do ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos e presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, faz as críticas mais contundentes à operação deflagrada em Curitiba.

“Todos embarcaram nessa ilusão que os excessos da Lava Jato e as 10 medidas contra corrupção significaram um avanço. Mas ficou claro que os fins jamais justificam os meios. Hoje, o País e os julgamentos do STF refletem isso”, afirmou. Quando questionada se é uma advogada “antilavajatista”, no entanto, ela rejeita o rótulo. “Não quero esse carimbo. Vai aparecer que sou pró-corrupção. Sou uma crítica da ruptura com o sistema constitucional que redundou em excessos da Operação Lava Jato”.

Com tons diferentes, os demais candidatos concordam sobre esse tema. “Houve abusos da Lava Jato e o Judiciário reconheceu isso. Mas o Ministério Público merece nosso respeito. Um grupo de promotores não pode pretender ser maior que a própria promotoria”, disse Caio Augusto. “A Lava Jato extrapolou em muitos pontos e criou uma cultura jurídica de autoritarismo penal muito perniciosa e que se espraiou”, afirmou Patrícia.

O trio de candidatos é cuidadoso, mas diverge ao tratar sobre uma pauta que hoje divide a OAB nacionalmente: o impeachment de Bolsonaro. A entidade, que esteve na linha de frente do Fora Collor ao Fora Dilma, recebeu um parecer jurídico robusto indicando crimes de responsabilidade contra o atual chefe do Executivo, mas interditou o debate e se absteve de ir às ruas.

“O impeachment é um debate que não está maduro no contexto da Ordem”, afirmou Caio Augusto, que recebe apoios de advogados mais conservadores do interior. Dora criticou o silêncio da Ordem em não engajar a classe no tema. “Entendo que as violações cometidas pelo presidente configuram crime de responsabilidade, mas é uma opinião pessoal. E, sim, a Ordem tem de encampar o impeachment”, disse ela.

“O processo de impeachment embute um cavalo de Troia parlamentarista, o que é muito ruim. É um instituto muito delicado que causa muito dano. Tenho muitos problemas com o instituto do impeachment”, afirmou Patrícia.

Críticas ao sistema de votação da OAB

Segundo o Estadão, as duas candidatas criticam o sistema de votação adotado pela OAB-SP, que será presencial. A avaliação é de que isso favorece o candidato da situação, pois abre caminho para as abstenções. O presidente disse que as regras são federalizadas e nunca existiu uma autorização para fazer a eleição em um modelo diferente daquela que está prevista no estatuto da advocacia.

Com uma campanha mais modesta e sem o mesmo volume de apoio que os adversários, o advogado Alfredo Scaff Filho, de 51 anos, tenta montar uma chapa para “correr por fora” na eleição da OAB-SP. Delegado da Polícia Civil entre 1996 e 1999, ele atua hoje na área pública. Com um perfil mais conservador que os concorrentes, Scaff é crítico do que chama de “estado político partidário” da OAB local e nacional.

Sobre o impeachment de Bolsonaro, disse que não é “nem contra, nem a favor”, e considera que a Lava Jato “foi um grande procedimento que deve ser aplaudido”, mas aponta erros da operação: “O que não pode é ter pirotecnia. Infelizmente houve uma cascata de erros no conjunto da obra”.

O quinto candidato à presidência da OAB-SP, o criminalista Mário Oliveira Filho, não respondeu à reportagem.

Mestre em Direito Constitucional e sócio do escritório Silva dos Santos e Aznar Sociedade de Advogados. Tem 24 anos de atuação na área do Direito. Atualmente é presidente da OAB-SP, gestão 2019/2021, e membro do Conselho Consultivo da ouvidoria da polícia do Estado de São Paulo. Anteriormente, foi secretário-geral da OAB-SP e presidente da Subseção de Bauru, além de presidir comissões especiais da entidade.

Formada na Faculdade de Direito da USP, tem 20 anos de experiência na área criminal. Após temporada como visitante do California Innocence Project, fundou e é diretora do Innocence Project Brasil, que se dedica a combater a condenação de inocentes no País. É conselheira nata do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), que ajudou a fundar e do qual foi presidente (2002 a 2007). É sócia-fundadora do escritório Cavalcanti Sion Salles Advogados.

Possui graduação, mestrado e doutorado em Direito pela PUC-SP. É fundadora e diretora do Movimento 133 – M133. Foi vice-presidente da Associação dos Advogados Criminalistas de SP (ABRACRIM-SP) e sócia do escritório Brito, Vanzolini e Porcer Advogados Associados. Leciona em diversos lugares, como a Universidade Presbiteriana Mackenzie, e é autora de obras como Manual de Direito Penal e Teoria da Pena: Sacrifício, Vingança e Direito Penal.

Fonte: Socialismo Criativo - Com informações do Estadão